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Memento, meu primeiro escrito

  • Foto do escritor: Ana Penna
    Ana Penna
  • 28 de mai. de 2020
  • 2 min de leitura

Atualizado: 27 de jun. de 2021


Há muitas formas de se começar uma narrativa e eu escolho começar esse blog pelo texto que me reintroduziu ao desejo de escrever. A construção do lugar em que estamos agora é, em parte, fruto da experiência de ter sido lida nesse primeiro escrito.


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Antes de partirmos para o escrito de fato, gostaria de fazer uma breve introdução. Memento foi o nome dado à exposição individual do artista e amigo Lucas Soares. Já pudemos dividir muitos projetos, mas esse foi especialmente importante por ter sido o primeiro no qual atuei efetivamente como curadora, ao lado de outra grande amiga, Mariana Couto.


A mim coube a tarefa de redigir o texto de abertura da exposição, que nesse contexto marca o início, o convite à experiência. Até aquele momento, meus processos de escrita culminavam em textos excessivamente acadêmicos que pouco me estimulavam. Entretanto, sob o olhar cuidadoso de todos aqueles que fizeram parte da equipe que tornou essa exposição possível, redescobri uma forma de afetar e ser afetada pelo que me comove.


Sem mais delongas, o texto:

Juiz de Fora, novembro de 2019


Há algo de extraordinário ao se pensar numa sala de estar como um cômodo feito especialmente para se estar, afinal, o que é preciso para que se esteja presente? Tempo? Escrevo para assegurar que estou, mas ainda sem saber se o que trago nessa carta tem mais de mim ou do que vejo aqui.

Se no crochet para concluir um ponto é necessário voltar dois, antes de prosseguir, gostaria de retornar à palavra que dá nome a essa exposição. Daqui de onde estou, Memento é também encontro.

Descubro numa breve pesquisa que há uma expressão, memento mori, que é o sussurro que te lembra de que um dia você vai morrer. Mas memento é também prece que se reza, ou ainda, uma simples nota, uma reminiscência.

Não sei ainda de qual desses sentidos gosto mais, nem se todos estão aqui. Sei que essa exposição é sobre um íntimo. 

Paul Valéry falou certa vez que o que há de mais profundo no homem é a pele. Gosto de pensar que o que importa está localizado justamente no que é superficial. A pele que reveste nosso corpo é também o lugar do encontro e início das trocas com o outro. Sem a pele não há subjetividade possível, nem mesmo sua ficção.

Penso que o que Lucas Soares faz em seus trabalhos é um processo de investigação dessa pele própria, da corrosão dela, ou então da forma como é tecida. É uma espécie de arqueologia do eu, onde as lacunas entre os fragmentos encontrados são preenchidas, ora pela materialidade, ora pelo olhar de quem vê. A frustração de não controlar a ferrugem ou de errar um ponto é, ao mesmo tempo, a janela que se abre para os vestígios de histórias que não se conhece.

A pele é presença e passagem. Está em construção. E como numa sala de estar, neste lugar, agora, o importante é estar.

Espero, sinceramente, que a narrativa iniciada não termine aqui de ser tecida.


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